O processo começa com a estimulação ovariana controlada, em que a mulher utiliza hormônios por aproximadamente 8 a 12 dias para estimular os ovários a produzirem múltiplos óvulos (em vez de apenas um, como ocorre naturalmente). Durante esse período, são realizados exames de sangue para controle hormonal e ultrassonografias transvaginais frequentes para acompanhar o crescimento dos folículos.
Quando os folículos atingem o tamanho ideal, é istrada uma medicação para amadurecimento final dos óvulos e, aproximadamente 36 horas depois, ocorre a punção ovariana transvaginal guiada por ultrassom, sob sedação. Os óvulos maduros coletados são imediatamente preparados no laboratório e submetidos à técnica de vitrificação, um método de congelamento ultrarrápido que reduz o risco de formação de cristais de gelo, aumentando significativamente as taxas de sobrevivência celular.
A técnica é recomendada em duas situações: preservação social da fertilidade — para mulheres que desejam postergar a maternidade por motivos pessoais, educacionais ou profissionais — e preservação oncológica ou médica, indicada para aquelas que enfrentarão tratamentos que podem comprometer a fertilidade, como quimioterapia, radioterapia pélvica ou cirurgias para endometriose e tumores ovarianos.
A chance de gravidez futura está diretamente relacionada à idade da mulher no momento da criopreservação, já que a qualidade e a quantidade dos óvulos diminuem com o tempo:
Esses números são estimativas populacionais, e a chance individual pode variar conforme a saúde reprodutiva, o número de óvulos congelados e a técnica laboratorial. Para maximizar o sucesso, recomenda-se o congelamento de 15 a 20 óvulos antes dos 35 anos. A qualidade dos óvulos, mais do que a idade na utilização, é o fator determinante: se os óvulos forem congelados aos 32 anos e usados aos 42, o potencial reprodutivo será o de uma mulher de 32 anos.
O congelamento de óvulos envolve custos relevantes:
A decisão de congelar óvulos é profundamente pessoal e pode envolver sentimentos como alívio, ansiedade, esperança e incerteza. Muitas mulheres enfrentam a pressão social de se tornarem mães em determinado período da vida, além da influência do “relógio biológico”, que acelera a tomada de decisão.
O congelamento de óvulos não é garantia de gravidez, mas sim uma possibilidade real. A mulher pode, com idade mais avançada, ter as mesmas chances de sucesso que teria na época em que congelou seus óvulos. Trata-se de uma ferramenta poderosa de planejamento reprodutivo, especialmente quando realizada com informação de qualidade, responsabilidade e acompanhamento médico.
A maturação in vitro (IVM), por exemplo, permite o amadurecimento de óvulos fora do corpo da mulher e é uma alternativa para pacientes com síndrome dos ovários policísticos ou que não podem se submeter à estimulação convencional. Pesquisas buscam melhorar os meios de cultura da IVM, tornando-a mais ível, segura e eficaz.
Outra inovação é o uso da inteligência artificial (IA) na seleção de óvulos e embriões. Algoritmos analisam imagens e dados para identificar os gametas com maior potencial de sucesso, aumentando as taxas de gravidez e reduzindo o tempo até uma gestação bem-sucedida.
Para pacientes que não podem fazer ou esperar pelo ciclo de estimulação ovariana — como meninas pré-púberes ou mulheres que precisam iniciar rapidamente tratamentos oncológicos — a criopreservação de tecido ovariano é uma opção viável. Fragmentos do ovário são congelados e, no futuro, podem ser reimplantados, permitindo a retomada da função ovariana e até gravidez natural.
O congelamento de óvulos representa, sim, uma forma moderna de autonomia reprodutiva, que permite que as mulheres tenham mais controle sobre o seu tempo e suas decisões. Mas essa escolha deve ser feita com base em informação de qualidade.
A preservação da fertilidade não é sobre adiar um sonho — é sobre escolher o melhor momento para realizá-lo.
*Artigo escrito por Maria Cecília Erthal (CRM 408660 RJ – RQE 30301), médica especialista em Reprodução Assistida e membro da Brazil Health