O trabalho, conduzido por pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, descobriu que pessoas com diabetes tipo 2 que receberam medicamentos da classe dos GLP-1 -- a mesma do Ozempic e Wegovy -- tinham mais do que o dobro da probabilidade de desenvolver DRMI úmida do que aquelas que não receberam. O estudo também mostrou que quanto mais tempo as pessoas eram tratadas com esses medicamentos, maior era o risco.

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A degeneração macular é uma doença degenerativa que afeta a mácula, a região do olho responsável pela visão central. Os principais fatores de risco são a idade (a partir de 50 anos) e predisposição genética ou história familiar. Segundo Mauro Goldbaum, diretor da Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo (SBRV) e do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), essa é a principal causa de perda de visão na população com mais de 50 anos em países desenvolvidos.

Existem dois tipos de DMRI: a seca e a úmida. "A doença começa com a forma seca, que é menos agressiva, mas aproximadamente 10% dos pacientes vão converter para a forma úmida, onde há o crescimento de vasos anômalos e vazamento de parte do sangue para a mácula", explica Goldbaum à CNN. Ele não esteve envolvido no estudo. "Na forma úmida, há uma degeneração da mácula mais rápida e intensa com diminuição súbita da visão central", completa.

Como o estudo foi feito?

O estudo foi feito com base em registros de saúde de Ontário, no Canadá. Os pesquisadores analisaram quase 140 mil adultos com diabetes tipo 2 para investigar uma possível relação entre o uso de medicamentos da classe dos GLP-1 e a DMRI úmida. Os pacientes foram acompanhados durante um período de três anos, usando dados coletados entre 2020 e 2023.

Cerca de um terço dos participantes — aproximadamente 46.000 pessoas — havia recebido um medicamento GLP-1 por pelo menos seis meses. O restante não. Na maioria dos casos (97,5%), esse medicamento era a semaglutida, o ingrediente ativo do Ozempic e do Wegovy.

Segundo a pesquisa, aqueles que receberam um medicamento GLP-1 tinham mais do que o dobro de chance de serem diagnosticados com DMRI úmida. Além disso, aqueles que tomaram o remédio na marca de 18 a 30 meses, o risco mais que dobrou em comparação com os não usuários. E aqueles que tomaram os medicamentos por 30 meses ou mais tiveram mais que o triplo do risco.

Apesar do aumento do risco, o risco absoluto de desenvolver DMRI úmida ainda era baixo: 0,2% entre aqueles que tomavam um GLP-1 e 0,1% entre aqueles que não tomavam.

Estudo deve ser interpretado com cautela, diz especialista

Essa não é a primeira vez que medicamentos como o Ozempic e o Wegovy são associados a uma doença ocular. Um estudo publicado em dezembro mostrou que pessoas que tratam diabetes tipo 2 com Ozempic têm um risco aumentado de desenvolver danos ao nervo óptico do olho, podendo levar à perda grave e permanente da visão.

O trabalho reforçou uma preocupação já apontada por outro estudo anterior, publicado em julho de 2024. No trabalho americano, foi observado que o Ozempic pode mais que dobrar o risco de uma doença rara chamada NAOIN (neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica, na sigla em inglês), que causa danos ao nervo óptico.

Apesar disso, Goldbaum afirma que ainda há necessidade de cautela na interpretação destes achados, já que as conclusões dos estudos não são definitivas. "A possível associação de análogos ao GLP-1 com neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica também é controversa", afirma. "Há ainda poucos estudos, todos baseados em bancos de dados com suas limitações inerentes, alguns estudos sugerindo a associação e outros não", completa.

Em relação ao estudo mais recente, o especialista afirma que não foi possível confirmar se a relação entre medicamentos como Ozempic e Wegovy de fato existe. "Os autores sugerem uma explicação muito teórica. Se a associação se confirmar com outros estudos, naturalmente teremos mais dados para nos ajudar a pesquisar mais especificamente quais as possíveis causas e mecanismos", afirma.

"Os dados são muito limitados, geralmente baseados nos códigos das doenças e dos tratamentos, sem detalhes dos exames médicos. Por exemplo, neste estudo não se incluiu o principal fator de risco para DMRI úmida, que é a presença e situação da DMRI seca antes de haver a conversão para DMRI úmida", completa.

Fabricante do Ozempic e Wegovy diz que não há riscos comprovados

Em nota enviada à CNN, a Novo Nordisk, farmacêutica fabricante do Ozempic e do Wegovy, afirmou que, em estudos realizados com semaglutida em pacientes idosos (acima de 60 anos), não foi observada diferença entre quem fez o tratamento e quem não fez.

"Portanto, a Novo Nordisk não conclui uma relação causal entre o uso de análogo de GLP-1, semaglutida e Degeneração Macular Relacionada à Idade", afirma a empresa.

Além disso, a farmacêutica afirmou que já está trabalhando em um estudo para examinar a possível relação entre a semaglutida e distúrbios oculares. O projeto, chamado FOCUS, está sendo conduzido para avaliar os efeitos a longo prazo do medicamento no desenvolvimento e progressão da retinopatia diabética em pessoas com diabetes tipo 2. A previsão de conclusão do estudo é o segundo semestre de 2027.

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